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A importância da Serra da Mantiqueira

Recentemente, a Serra da Mantiqueira foi considerada como o 8º lugar mais insubstituível do planeta de acordo com a IUCN (União Internacional para Conservação da Natureza) e com artigo publicado pela revista Science

As regiões montanhosas dos neotrópicos são importantes centros de diversidade biológica. Na América do Sul, a Cordilheira dos Andes, o Planalto das Guianas, a Serra da Mantiqueira, a Serra do Mar, a Serra Geral, a Cadeia do Espinhaço e o Maciço Goiano representam cadeias montanhosas que ultrapassam 1.000 metros de altitude, nas quais podemos observar a ocorrência de habitats únicos para muitas espécies da fauna e flora, portanto relevantes para o patrimônio natural em escala global.

O nome Mantiqueira tem origem na língua Tupi Guarani – amana chuva; tiquera gotejar; chuva que goteja – a montanha ou serra que chora foi o nome dado pelos indígenas que habitavam a região, provavelmente devido à elevada umidade do ar e à presença de neblina que, captada pela vegetação que recobre a Serra da Mantiqueira, produz inúmeras nascentes e riachos. A Serra da Mantiqueira representa a região mais fria e úmida ao leste da América do Sul (região sudeste do Brasil) e, em conjunto com o complexo Serra do Mar/Serra de Paranapiacaba, constitui a cadeia montanhosa de maior destaque nessa região sul da borda do Oceano Atlântico.

A região da Serra da Mantiqueira destaca-se por estar totalmente inserida dentro do bioma Mata Atlântica, considerado um dos principais hotspots mundiais da biodiversidade, por ser um dos biomas mais biodiversos do planeta, com alto grau de endemismo e acentuado nível de degradação. Estima-se que restam apenas 12% de cobertura florestal original, que abriga mais de 8 mil espécies vegetais endêmicas.

Com água em abundância e temperaturas mais amenas, a Serra da Mantiqueira abriga ecossistemas naturalmente raros e em grande parte restritos aos topos das montanhas: é o caso das florestas com araucária (Floresta Ombrófila Mista), florestas de neblina (Floresta Ombrófila Densa Alto-montana) e campos de altitude (Estepe Alto-montana). Paralelamente a estes atributos naturais, a Serra da Mantiqueira também tem um papel relevante na história brasileira, tendo sido o caminho escolhido pelos bandeirantes para algumas das principais rotas de colonização do interior do Brasil e possuindo uma tradição cultural, religiosa e gastronômica reconhecidamente rica e diversa.

O grande naturalista Auguste de Saint-Hilaire, ao cruzar a região de Passa Quatro, sentido Vale do Paraíba, em 14 de março de 1822, em função de sua visita à Província de São Paulo, relata muito bem esta conjunção entre as riquezas naturais e culturais que existem na Serra da Mantiqueira e fazem parte de sua história:

Seguimos um vale bastante largo cercado de montanhas pitorescas e coberto de árvores no meio das quais se destacava sempre a majestosa araucária. Este vale é regado por um rio que da mil voltas e pelo qual passa quatro vezes para chegar aqui, donde lhe vem o nome de Passa Quatro. Suas Margens apresentam, alternadamente pastos, capões de mato elevado, terrenos cultivados entre os quais se vê a distancia em distancia grupos de pinheiros. Pequenas casas acrescentam ainda nova variedade à paisagem. A nossa frente tínhamos a Serra da Mantiqueira, cujos cumes, bastante diferentes pelo formato, são cobertos de sombrias florestas. Nenhum outro vale lembra melhor os vales da Suíça do que este de que acabo de fazer a descrição.

Auguste de Saint-Hilaire
Naturalista

Não é a toa que em 03 de junho de 1985 foi decretada a criação da Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira (APASM), unidade de conservação federal de uso sustentável, que abrange 30 municípios dos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. A APASM foi criada, seguindo consta em seu decreto de criação, para “garantir a conservação do conjunto paisagístico e da cultura regional da Serra da Mantiqueira, parte de uma das maiores cadeias montanhosas do sudeste brasileiro, bem como os remanescentes florestais da região, a continuidade da cobertura vegetal do espigão central, a flora endêmica, a vida selvagem, principalmente as espécies ameaçadas de extinção e proteger os mananciais e as nascentes de cursos d’água existentes na região”.

Em território paulista, as nascentes da Serra da Mantiqueira contribuem para o abastecimento de água das bacias hidrográficas do Rio Paraíba do Sul, Rio Tietê e Rio Grande, sendo a sua proteção a única garantia eficaz da qualidade ambiental e da estabilidade hídrica e geológica para os municípios ali presentes.

Além da APASM, existem na Serra da Mantiqueira diversas unidades de conservação de proteção integral, como o Parque Nacional do Itatiaia (1º parque criado no Brasil), Parque Estadual da Serra do Papagaio, em Minas Gerais, Parque Estadual da Pedra Selada, no Rio de Janeiro e o Parque Estadual de Campos do Jordão, além dos Monumentos Naturais do Pico do Itaguaré e da Pedra do Baú, em São Paulo. Também existem diversas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) criadas em propriedades particulares nesta Serra, que foram transformadas em unidades de conservação de caráter perpétuo a partir da vontade de seus proprietários. A atuação das organizações ambientais na região é de grande relevância para a manutenção da Serra da Mantiqueira. Diversas instituições focam suas ações nesta região, trazendo recursos para a execução de projetos de conservação, incentivando a pesquisa, fomentando a educação ambiental e a adoção de boas práticas nas comunidades rurais.

É lógico que apesar de todos estes esforços aqui elencados, a Serra da Mantiqueira está muito aquém da proteção que merece, devendo sim receber mais atenção por parte do poder público, da sociedade e da mídia nacional. Porém muito tem sido feito, seja por produtores e proprietários de terras, seja pelo poder público, entidades não governamentais, sociedade civil e entidades de classe. Este extenso esforço e dedicação voltados à proteção da Serra da Mantiqueira devem ser valorizados e servir de exemplo de que a conservação de um patrimônio nacional insubstituível deve ser feita unindo esforços de todos os setores, em prol da perpetuação de um bem da sociedade e da natureza brasileira.

CRÉDITOS/FONTES

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